olho as migalhas de pão
na mesa
olho as paredes desenhadas
de humidade
livros com gretas nas lombadas
o relógio pendurado
não trabalha
parou na hora da tristeza,
não tenho mais memórias
Deus me valha!
no corredor uma jarra
deitada ao chão,
imensa a noite
os olhos secos de tanta
solidão
apagou-se o lume na lareira
dissolve-se minha última esperança
tento adormecer as chagas
da lembrança,
perco a minha mão direita
já não me importo com as sombras
estou sem palavras,
as teias rodeiam-me a cabeça
enlouqueço com certeza
ouço o murmúrio da humanidade
que me desfaz o coração,
olho as fotos dos que partiram
- para sempre,
e me deixaram saudade
recordo ainda que seja
o resto de mim
não posso esquecer-me,
nem ninguém pode deter-me
vou sobreviver até ao fim
natalia nuno