sábado, 18 de janeiro de 2020

passam as tardes...


anda o corpo devastado pelos invernos
ficaram pássaros perdidos na primavera
fugiram do céu os azuis eternos
e estranha o coração dorido por quem espera
passam as tardes e a chuva faz-se ouvir
sobre meus dedos nem anéis, nem felicidade
e o poema a um passo de fugir
e mais uma linha quebrada entre mim
e a saudade...

surge a noite e nem uma estrela nova
inicia-se o sono a amadurecer-me os olhos devagar
nem poema, nem trova
e o sonho acaba em ondas mansas sem se molhar
entra-me a chuva pela janela da alma
a molhar os ninhos do pensamento
e o coração embrulhado de frio perde a calma
e com saudade entra em sofrimento

e o corpo devastado a não querer trair
rende-se à esperança que o vem agasalhar
mas vai-se o tempo dourado a despedir
e nos sonhos as giestas estão a embaciar
as palavras fracassam, não haverá poema
já não falamos a mesma língua
por muito que de dor minha alma gema
morreremos procurando o que nunca
se encontra, com saudade e à míngua.

natalia nuno
rosafogo

quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

menina do vento...


estendi a secar os meus sorrisos
lavei-os aos primeiros raios matinais
sentei-me no baloiço, menina do vento
e as águas do rio levaram meus ais
balancei num turbilhão de alegria
e o chilreio do pintassilgo despertou-me
o pensamento...
olho as árvores com as folhas perturbadas,
pelo vento,
os sapos parecem estar em festa
e eu calo-me para não espantar a esperança
antecipo a alegria de voltar a ser criança,
neste sonho que me resta.

junto ao muro espreitam-me os malmequeres
e eu despetalo-os para ver se ainda me queres
não magoes a minha ilusão
deixa o caminho entreaberto entre a minha e atua boca
onde vai matar a sede meu coração,
a remendar esta saudade que me põe louca.

natalia nuno
rosafogo
imagem pintarest


terça-feira, 14 de janeiro de 2020

deito-me à estrada...


a saudade é este vento agreste
que passa por mim com seu hálito
fresco, misterioso e saudoso
com ele traz as lembranças vivas
e meu olhar tumultuoso fica em festa
o coração um vulcão
a explodir de amor e, a saudade
é a cor que dá vida ao meu erguer
é a seiva do meu viver
a secreta maresia, que faz com que passe
a fronteira da tristeza à alegria.

meus dedos serão moinhos de vento
nada a barrar-me este antigo caminho
sou livre de pensamento
meu caminhar nunca será escuro cinzento
deito-me à estrada com coragem
que a vida é uma passagem
cheia de espinhos e rosas
e pétalas de emoção
saudade tiritando no coração.

incuráveis são as minhas palavras
que se soltam sonhando,
são pombas que nem o tempo pára.
por entre pedrinhas do ribeiro saltitando
e brincam como papoilas em seara.

natalia nuno
rosafogo
imagem (pintarest)


salpicos de sol...



é tempo de acordar a lembrança
que o tempo avança
resgatar a vontade de colocar flores
no cabelo, regar as ideias
tirar as nuvens dos olhos
abraçar a vida de todas as cores
olhar o sol do poente
e com salpicos desse sol
olhar o presente.

deitar na areia quente
mais um beijo neste outono
até cansar as saudades na gente
doutro tempo, em que nos deixávamos
no amor ao abandono...
prende-me a ti
que o sonho aparece de repente
vamos amar livres e soltos
até o sol desaparecer no poente.

deito sobre mim um olhar de rosas
e o sorriso me cai de novo na face
são-me estas horas generosas
o sonho me visita e é com certeza
como se a vida
voltasse...a ser surpresa!

natalia nuno
rosafogo
imagem pintarest





segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

pequena prosa poética ...agarram-me pelo braço



agarram-me pelo braço... e eu e as recordações fugitivas do tempo, o coração dando asas ao desejo de atravessar a fronteira ver de novo os instantes que alguma vez amei, e os pássaros avisam-me que a memória tem de ser audaz, capaz de fugir ao tempo que me rouba o meu mundo, que hipnotiza as minhas horas...este tempo que é anjo e demónio que me vigia em qualquer canto onde me abrigo, a maior parte das vezes me deixa criança confusa, que não distingue o sonho da realidade...então, deixo o pensamento ganhar asas.e aguardo que o sonho me abrace.
natalia nuno
rosafogo

domingo, 12 de janeiro de 2020

sonho com asas...



hoje as nuvens desfolham-se em pétalas
branqueiam o céu e o mar
parecendo velas desfraldadas
vêm o pensamento de lembranças povoar,
de azul enroladas...
e eu sou irmã do vento,
voejo de flor em flor
borboleta que procura um sonho d'amor.

preciso de pegar-te na mão
sentir a tua pele, olhar os teus olhos mel
provocantes, persistentes,
deixar-me emigrar nas marés do teu mar
e à tua sombra ser gaivota,
poder pousar...

será a colina onde te podes deitar
o meu ventre, e meu corpo
a febre dos sentidos, que podes
apaziguar...
e no meu sorriso de romã
poderás sentir que o nosso amor
é de ontem, de hoje e será
sempre de amanhã.

natália nuno
rosafogo
imagem pintarest
poema escrito em Tavira
02/01/2020





a saudade fez-se poema...



não posso perder as horas
nem perder a agilidade
poderei querer ir sem demoras
até onde pode levar-me a saudade
lá ao ventre das coisas
à maciez do cheiro
do xaile que me agasalhava
onde o sono era profundo
ao colo de quem me amava
escorre a maresia pelas heras
e eu preciso renascer
das coisas cansadas, das esperas
dos anseios, dos cardos do caminho
e voltar a querer ver
no cabelo flores de cerejeira,
ser possuída pelo vento na eira,
rir-me da dança das folhas no outono
pescar no rio sem anzol
correr pela aldeia sem dono,
e apanhar com as mãos as estrelas e o sol.

e assim, tudo floresce em mim
como flores que nas margens vão crescendo,
nas minhas feições o sorriso
por tudo o que está acontecendo.
é sonho, é caminho de utopia
mas preciso de sonhar e ousar
trazer de novo a felicidade ao meu dia,
parei na ponte, ouvi em êxtase o tocar do sino
aqui me sei ser, caminhei como peregrino
para aqui chegar, e mais acima esfacelei o sorrir
fecharam-se as portas e janelas
que só meu sonho pode voltar a abrir.

natália nuno
rosafogo




choviam ventos no pensamento...

quem me dera fechar os olhos, deixar-me adormecer naquele lugar onde os sonhos parecem reais, a escrita é o meu espaço, as palavras por vezes são hesitantes, outras deixam de ser minhas amigas, mas também me fazem reencontrar emoções e eclodem em mim visões daquele outro espaço, daquele outro tempo que eu gosto de voltar a sentir. Lúcida carrego dia a dia o fardo de ver-me envelhecer que é assim uma espécie de tortura, e à medida que escrevo minhas lembranças, os pensamentos carregados se atenuam e eu com subtileza aproveito esses momentos, e é então que crio um elo mais forte com o passado e com o lugar onde nasci.
Absorvo-me na contemplação, de coisas infantis algumas bem insignificantes, como por exemplo quando ficava seduzida pelo vento que passava por mim e me dizia coisas ao ouvido, inventava conversas com ele e com leveza me deixava ir, sonhando ser pássaro voando no imenso céu azul, ou então abrindo pequenos botões de papoila para ver se eram meninos ou meninas consoante a cor com que me deparava, se rosa menina, se branco menino, ingenuidade atravessada de alegria, trazia o sol na boca, meus anéis e colares eram de flores, e meu coração era um barco que navegava no sonho.
Tocava as estrelas com os olhos, apaixonava-me pelas cores do arco-íris, era maré inquieta em rebentação, trazia em mim o odor da maresia e a poesia já p'la mão.

natalia nuno

rosafogo