domingo era findo!
chegava a segunda-feira
e ao entardecer acabava eu de nascer
era janeiro, esse mês primeiro
tempo de guerra, tempo de morrer
nascia eu na pacata terra
quando o rio galgava as margens
o vento assobiava nas ramagens
do salgueiro, a ponte tremia
tempo cinzento saí do ventre era meu dia
o primeiro, uma criança é sempre sinal de esperança
os sonhos logo ali me povoaram
trazia amor para dar e logo me amaram.
aos meus ouvidos a chuva batia no telhado
logo despertam meus sentidos
ali fiz a primeira poesia, era meu fado.
os sinos repicavam avé-marias
todos os dias, na nobreza das tardes
e as crianças em correrias
no seu universo imagínário, viviam
suas verdades...
traziam a aldeia apertada ao peito
também eu ainda a sinto, mesmo ausente.
não há outro céu azul!
nem outro tão belo sol-poente.
trago em mim esta nostalgia visceral
ouço o salgueiro chorar, e o vento
no canavial, saudade do velho açude,
do moinho, da horta, das flores da mãe
da liberdade, de ser eu de verdade.
tudo ao tempo resistiu,
a ponte, o salgueiro e o rio
e até a menina de cintura fina
e pescoço esguio
parecendo flor, continua a sonhar
na sua memória ainda há grilos a cantar
figos na eira a secar, tanto cansaço e á terra amor,
com a frescura do orvalho vai trocando rimas
sempre a nascer,
até um dia de si mesma se perder.
natalia nuno
homenagem ao lugar onde nasci.