terça-feira, 31 de maio de 2022

minha lembrança muda...



as rosas choram em coro
protestam de coração partido
ao longe ouve-se o choro
sentem na pele o mundo dorido
pego numa haste desolada
ponho lírios nos cabelos
gemem meus sonhos pela calada
cresce em mim o medo de perdê-los
a minha lembrança é muda
será que para sempre morri?
digam que não, mas que ninguém me iluda
pois já não me sei aqui.

não se ouve mais nada que o pranto
das rosas que choram em coro
é grande o meu desencanto
jasmim molhado, meu choro

minha insónia é pássaro negro
meu coração bate em ânsia
bate p'lo teu em segredo
como se fosse sulcando um mar
ou um trigal onde o grão
são contas do rosário por onde rezo oração,
não sei porque me pus tão triste
nem sei de onde vem a tristeza
se o choro das rosas existe
já de nada tenho certeza!

natalia nuno
rosafogo
imagem do pinterest





segunda-feira, 30 de maio de 2022

saudade hoje...



a lua minguante pôs-se à minha janela 
e num instante, 
pus-me à conversa com ela,
este instante não poderá ser repetido,
já que a noite escurece,
e a saudade sonhos ainda  tece
a vida, essa, não fará mais sentido?!
falámos de restos de recordações, 
e lá foi esconder-se na escuridão,
enquanto eu, regresso à solidão.
ao meu mundo de ilusões.

tocou-me a memória, é de lá
que a conheço, 
do tempo em que o mundo era sossegado,
e agora que faleço
vejo o céu de mísseis ameaçado.
tempo inútil, tempo de ameaça
tempo de desgostos veementes
a guerra que não passa
e há gritos de revolta entre as gentes.

já trouxe em mim o pulsar da primavera
mas este tempo já nada de bom gera
trago o corpo esgotado, a noite escurece
e a lua me esquece...
já não falo com ela, da minha janela,
levou com ela minha ilusão
deixou-me a saudade no coração.

natalia nuno








domingo, 29 de maio de 2022

poema que não pode morrer...




os meus pensamentos prendem-se nas flores
duma velha jarra e nas fotografias
penduradas nas paredes da velha casa,
amores, alegrias, a quem quebraram a asa
as flores a murchar, tal como as vidas
dos que viveram a disfarçar
que foram felizes, e nos rostos a tristeza rasa.
olho-os na parede nos retratos amarelecidos,
parentes, ora lembrados, ora esquecidos,
lá em baixo o rio e a aldeia que os viu nascer,
nas hortas laranjeiras esqueceram de florir
tristes, desde que os viram partir.
as aves voltam sempre aos ninhos
e eu aqui, sempre com meus pensamentos
presos nestes caminhos.
porquê lembrarei eu estes parentes
alguns que nem conheci?
ao sol brincando, tão pequena
hoje sinto-me estrangeira aqui.
interrompo meu sono, volto sempre ao passado
à memória da infância
onde o Cristo na parede continua cruxificado.
também o velho candeeiro a petróleo,
e o calendário, a lembrar-me que nasci em Janeiro
sinto o rio nos meus olhos e a saudade submerge,
as moças de cântaro à cabeça na praça
e por onde quer que o meu pensamento passe
é a saudade que me abraça, 
e um novo poema nasce.

natalia nuno 
rosafogo