segunda-feira, 15 de setembro de 2025

quando o mundo pára...

há um brilho de vida

no olhar, quando falas de amor
na noite sempre se adivinha o desejo

e lá vem o calor, 

de mais um abraço

na boca o sabor, o sabor do beijo

no corpo o cansaço

o último estertor sai-nos da garganta

e um pássaro esvoaça na retina

tudo nos encanta, sou tua menina.


o tempo agrediu-nos, tanto devorou

mas o amor saiu ileso,  sobreviveu,

é lâmpada que não se apagou

 

natalia nuno

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palavras redimidas...



lá atrás ficou a juventude
abolida p'los anos
volto lá amiúde, em sonhos
para defrontar onde se meteu
minha euforia, minha alegria

à noite chegavam as estrelas
e os pirilampos do céu
no vaivém da nossa eira
as cigarras cantavam noite e dia
escondidas no trigo por malhar
a cotovia na oliveira se escondia
e o morcego que não dava sossego

tudo se enraíza na inquietude 
da minha memória
que saudade da minha juventude

na estrada o chiar dos carros de bois
e o pastor com rebanho logo depois

lá em baixo no rio
coaxavam as rãs
e eu, 
ouvia a melodia
ia longe, a noite de breu

na erva entrelaçavam-se as lagartixas
e nas árvores procurando pouso
os pássaros faziam rixas
logo a lua já me trazia o sono
e eu sonhava com ela no seu trono

fecho os olhos e ainda sinto
os aromas das flores de laranjeira
o voejar das abelhas nas cerejeiras

o sol crescia na ladeira
e um fervor ainda me alcança
tudo me chama, vive ama e canta
a alegria, a saudade, a criança
o ser inteira, neste sonho que criei
êxtase onde vivo e viverei

natalia nuno
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o que vira depois?...



perguntei-te outro dia

o que acontecerá aos dois

vivendo, sem mim vivias?

e o que virá depois?

talvez não juntos não caminhemos

talvez a vida imponha separação

mas de amor juntos viveremos

unidos pelo coração...

 

natalianuno

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sorrisos aos molhos...

nosso amor é loucura

é aroma que embriaga

que importa se é maior a ternura

doce prazer que nos afaga


é amor de perdição

pra mal dos nossos pecados

não quer saber da razão

traz-nos tão enamorados

 

este amor tão verdadeiro

que me traz assim tão louca

tem do alecrim o cheiro

o beijo da tua boca


vamos assim vida fora

trazemos sorrisos aos molhos

no silêncio desta hora

nos teus ponho meus olhos


amor que é mar embrabecido

que não se dá por vencido...

 

natalia nuno

12/2007

aldeia Sta Justa

rabiscos...



vidas serenas, solitárias e doridas

do trabalho árduo...

a minha memória demora-se um pouco a lembrar,

 a roupa estendida a secar ao sol, 

a louça lavada num alguidar de barro,

- o outono e os seus langores,

- as casas do lado de lá do rio, 

as pequenas ruelas estreitas e tortas,

as gentes cansadas ao anoitecer

- sentadas nas soleiras das portas, 

estas imagens ajudam-me a negar que tudo morresse...


natalia nuno

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rabiscos...cordão umbilical...



cordão umbilical

e tudo se cumpriu, mas não como nos sonhos daquela menina de silhueta magra, a miúda da minha memória que se agarra a mim, e parece não querer cortar o cordão umbilical que nos une, garota que parece ter adormecido com o rosto entre as mãos, gostava de a poder reconfortar, mas os nossos silêncios são mistérios que tecem memórias, onde o sol começa a desaparecer...

natalia nuno

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sábado, 13 de setembro de 2025

coisas de poeta...




ouço a chuva a murmurar uma ladainha, 
enquanto vai humedecendo as folhas caídas pelo chão, 
nem uma estrela visível no céu, e eu, 
aqui surda e muda e esta vida que já não muda... 

cada gota de chuva cai no meu coração,
- poema que escrevo, fica tanto por dizer
- e a noite a tecer sonhos, 
não sei se devo ou não devo, 
colocar o amor mais perto de mim

- e pôr fim à dor da solidão!
 já que meu coração
 é folha caída, 
que me ampara na descida...

natália nuno
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como rio em busca do seu leito...




a minha infância ainda me sabe a pão
saído do forno de lenha
e estes olhos tristes passam por ela
em solidão
como rio em busca do seu leito
tento reunir memórias e a saudade
me embrenha

lembro o caldo verde da horta
no forno as petingas com azeite
o jogo da malha, e chegar a casa
quase morta

morta de cansaço do banho no rio
da cadeirinha ao lado da lareira
dos dias de chuva e de frio
e a avó rezando ali à beira

fervia a cevada nas brasas
ouvia -se no céu o ribombar
da tempestade invernosa
os pássaros paravam de bater as asas
logo depois o raiar do sol
e as bruxas a fazer pão mole

o arco íris mostrava-se orgulhoso
com tantas cores,
enquanto eu sonhava despertando
para os amores.

pálido papel molhado
espelhos mortos, casa esquecida
pensamento esfarrapado
a memória desses dias já é quase nada
pela desmemória mordida
deixo-me no refúgio da madrugada

aonde ir? aonde ir?!
se as palavras já lá não vão
não sei por quanto tempo as vou seguir,
já caio na solidão!

neste comprido corredor
cada  vez mais estreito
lembro com dor
as fendas do meu quarto
golpeado pelas imensas noites do tempo
deixo as lembranças e parto.

natalia nuno
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domingo, 7 de setembro de 2025

desejo...

 


hoje não se ouvem os pássaros
 e há árvores que choram,
 enquanto eu,
 desenrolo imagens no pensamento
 como se as voltasse a viver e,

 decido amar-te de novo
 como se fosse a primeira vez...

natalia nuno
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tão pouco...




tão pouco, me consola nesta hora
não posso transformar palavras
em sonhos
calo o desencanto por agora
o que assoma ao pensamento
murchando meus sentimentos

enquanto a vida vai semeando ventos
fazendo ecos do que já não existe,
no coração, nem nos pensamentos,
onde só a saudade persiste!

reclamo da vida um pouco
de dignidade
tenho dúvidas, que não mereço,
uma desolação em absoluto
cedo à terra dos sonhos, esqueço

o porquê das sombras e da nostalgia
e o desconsolo desta vida vazia,
cerca-me a frieza dos sentidos
e calo as palavras em 
em papéis pelos anos corroídos.

bailam nas janelas dos olhos
as cortinas
surge a nortada, 
caindo, já não sirvo para nada
ai vida, já nada me ensinas!

o porvir é agora amarela gargalha.
.
natalia nuno
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rabiscos....


 amo a luz

quando o sol dorme,

adormece o coração,

amadurece a escuridão

e, eu que amo a luz,

acalento-me na esperança duma nova madrugada

logo a minha alma respira

e o coração bate

no desejo de ser amada...


natalia nuno

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rabiscos...

 



sopra um vento forte

entre o começo e o fim
entre a vida e a morte
já não lhe ofereço resistência

vai-me levando assim.


- tropeço por fim!


passam por mim pássaros chilreantes

a alegrar meu coração sonhador

e não perdedor,

por alguns instantes...

 natalianuno

rasbiscos...



abro as gavetas às escondidas, meus dedos leves dedilham memórias, e enternecida recolho palavras debaixo da língua cheias de saudades de tudo que só eu sei...saudades tão grandes que não cabem no peito, respiro fundo e sinto o coração a bater, cada lembrança faz ninho em meus olhos e cura-me da solidão... vim voando desde a Primavera, até que o Inverno me tocou, e poisei no chão da desilusão, morreu-me o tempo dos sonhos, despi-me de papoilas, vesti violetas, esfacelei o riso e agasalhei a saudade que é na verdade a giesta que desembacia a poeira do meu dia...

natalia nuno


 Obrigada a todos, estes pedacinhos de escrita, são poemas escritos pelo caminho que ficaram apenas no papel, de quando em quando encontro um ou outro e vou passando para um blog meu «palpável silêncio», que nunca dei a conhecer e onde todos os poemas são assim pequenas formas de querer dizer muito. Bjs



rabiscos...

 



(rascunhos)

a lucidez sempre nos interroga... porquê esse vôo até ao obscuro, porquê esse abismo inesperado, essa inquietude que é fogo, esse contar de rugas novas... deixa que te acompanhe a formosura do vento, o correr das fontes azuis, a verdade dos sonhos, despoja tudo o que é dor e deixa-te levar num passo doce, com os olhos duma criança...
natalia nuno

rasbicos...




sem cura...
por entre a intermitência do caminho,
sento-me a pensar em ti
com carinho,
o vento bate na janela da insónia
a única coisa que não entendo
é este silencioso grito que me vai na alma
esta loucura, este amor frenético
sem cura...
natalianuno
(rabiscos)

quinta-feira, 4 de setembro de 2025

poema por acabar...

 


olho a doçura deste azul celeste
devolve-me a ternura de viver
perco o medo de morrer!
carrego a tristeza,
palavras são em vão
depressa escurece meu coração

escrevo poemas de monotonia
sofredora, escrevo por aí fora
seja noite ou dia,
seja qual fôr a hora!

é assim que eu os sinto
nas veias, 
e desfaleço num silêncio absoluto
e ainda que não os leias,
meu coração impõe-se, com ele luto,

minhas mãos numa queda a pique
é pouca ainda a luz da madrugada
e o poema quer que fique!

foge-me a inspiração
fica o poema numa desordem delicada
fica tudo do avesso
o coração dentro das paredes
a estoirar
luz à imaginação peço,
para o poema acabar.



natalia nuno
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quarta-feira, 3 de setembro de 2025

palavras já se perdem...



procuro o sítio certo
quero chorar com as rosas pela manhã
ou com os jasmins orvalhados
tirar-me destes meus cuidados

só eles sabem do meu anseio!

de permeio
um cheirinho a alecrim, 
poder fugir de mim
e da solidão que envelhece

procuro lugar neste poema
que é minha paixão
afundo-me na ondulação
deste mar que me acolhe nos abraços

palavras já me fogem, pra não me ver só
os crisântemos, olham-me com dó

nesta descida para o desconhecido
o silêncio é ruído
a inspiração no esquecimento,
confusa e confinada
impelida a procurar alento
nas palavras quebradas
vindas do
coração e da alma.

natalia nuno
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terça-feira, 2 de setembro de 2025

metade luz, metade escuridão...




todos os dias são preciosos
especiais!
até aqueles que doem e, solto meus
ais.
e quando vejo o dia a morrer
retrocedo anos, para o presente
não me doer
é na escuridão, que olho o tecto
e a saudade começa a martelar
como centelha incandescente
lembro o afecto
e lembro o amor teimosamente!

amor que cresceu e deu semente
estranho ardor que ainda me embriaga
e me dá alento
paisagens da alma a todo o momento
em metades luz e, escuridão

vestígios fugazes na mente e no coração

os meus olhos fazem a colheita
é quase inverno e o sonho se deita
rodeiam-me ecos cheios de ameaças
afasto-os do meu mundo
fecho as vidraças

sinto indiferença do que se passa
à minha volta
já me ameaçam as recordações
é o preço da liberdade de me sentir solta
não quero ilusões, exijo a verdade
ergo-me até ao fim!

natalia nuno
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sábado, 30 de agosto de 2025

há dias assim...



há dias em que me sinto estranha
dentro e fora de mim
sentimento ruim me acompanha
sem saber quem me afasta ou me chama
quem nunca se sentiu assim?

mas hoje sinto-me em liberdade
aprendi a não sentir falta
é minha escolha a saudade
começo a aprender a amar-me
ao coração dei alta

às vezes preciso fazer de conta
ah esta menina tonta!
tem medo, mas é segredo
nem sabe onde se meter
devagar, é seu desejo não envelhecer,
mas vai apressada a correr

pergunta por ela,
- e o tempo responde-lhe:
não tens saída, é esforço vão
foi-se o riso ébrio dos teus olhos
- mora agora neles a solidão!

natalia nuno

quinta-feira, 28 de agosto de 2025

choro por mim




lentíssimo verão,
silêncio envelhecido
poema revivido
pobre coração!

poema que atraiçoa
servil em trazer a dor
não há dor que não doa
quando o assunto é amor

minhas letras molhadas
de lágrimas choradas
afogam-me perdida
pernoita no coração a ferida

choro por mim
desilusão no olhar
já fui flor de jardim
despedaça-me o tempo por fim

ao silêncio encostada
este me devora
amar não, não é ser amada
o amor vem e vai embora

memórias desarrumadas
neste poema onde esvaziei
lembranças perfumadas
que com carinho te dei.

natalia nuno
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quarta-feira, 27 de agosto de 2025

ouço a saudade a falar...

um peso ao princípio
da noite
uma guerra aberta no peito
e eu sem saber do jeito
de amainar a tempestade,
instantes de nostalgia
em que o coração arfa
e o olhar chora
da saudade na hora.

um pacto secreto
entre o sol e a lua
e eu como uma adolescente
a crescer, digo que te amo

é fácil de adivinhar
a fotografia não vai responder
ouço a saudade a falar!

ouço os meus pensamentos
o destino toma o rumo que tem de ser
é nestes momentos, não há como saber
a vida é agridoce
os anos passaram, mas é como se ontem fosse

há espaço para a melancolia
- sigo em frente!
amanhã é outro dia
comportar-me-ei ainda  como 
como adolescente.

natalia nuno
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terça-feira, 26 de agosto de 2025

o voo sonhado...



sufoco o grito na garganta
a vida a meio parou
a sombra em mim já se agiganta
só essa sombra agora sou!

trago o corpo na prisão
e a alma em liberdade
perdido meu coração
só o sonho e a saudade
tomam conta da minha mão

escrevi canteiros de flores
poesias que não floriram
o coração preso em amores
que por mim nada sentiram

pássaro que não pôde voar
estando longe está por perto
três letras para falar
saudade, amor e deserto
por fim um pouco de alegria
ao nascer de cada dia

na noite a saudade que se arrasta
chorando ao ouvido devagarinho
a lembrar-me que o caminho
ainda me traz sol ao rosto!
depois que o sol é posto
o coração pede atenção

sonhando coleciono asas multicor
para aprender o voo
da abelha sobre a flor.

natalia nuno
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é todo o meu sentir...



devo ou não devo sonhar?
pergunto a mim própria
se terei que pensar num céu
só meu
e arranjar asas para nele voar

entre mim e o sonho
há uma realidade
onde me sinto perdida,
apenas é real o bater do coração
a vida é uma ilusão!

é este coração que almeja existir
passa por mim a sombra rente
e ele, morrendo completamente,
rodopia o olhar
e é todo o meu sentir
metade de mim é saudade
sonho e loucura
a outra é estranha realidade
que até hoje dura!

hoje trago o olhar verde
duma floresta
é tudo que me resta!

no fim, eu só quero a sombra 
duma árvore, para poder descansar.

natalia nuno
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segunda-feira, 25 de agosto de 2025

a poeta...



a poeta,
- tudo o que faz
pensa que é ruim
que nada presta, que não é capaz,
esconde-se num céu cinzento
acorda, e surpreendida
tem p'la frente mais um dia de vida
à espera daquele sol que vai
surgir no firmamento
despreocupado e lento,

ela corre a fazer de conta
pois raramente sai do mesmo lugar

sem se aquietar,
escreve poemas sem conta
que ninguém lerá,
fala de saudade logo ao acordar
como quem um tapete tece
sem saber ler, nem escrever
o poema acontece
e seu destino desconhece

a poeta
não tem tempo pra nada
nem para chorar!
ora em desassossego, ora sossegada,
como tempestade, carrega o passado
trá-lo guardado

na memória e no coração
tantos anos já lá vão!


natalia nuno
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domingo, 24 de agosto de 2025

o grito!...


a vida é um livro de recordações
companheiro até ao fim,
tudo nele, sonhos da alma, ilusões,
dúvidas e incertezas em motim
alucinação, sonhos rendidos
tudo o que leva o coração ao desvario
nesta hora, 
em que sonhar nada melhora.

sombras que na noite apoquentam
são os risos que se aposentam
falsas maravilhas
insólitos instantes
prazeres distantes,
e assim se adia a sentença
procurando a dia renascer
o destino não há quem vença

o sonho nunca é inteiro
vagabundo no rosto, o tempo a correr
discreto, mas presente e verdadeiro

e o livro vai ficando escrito
é a soma da vida, o grito!

natalia nuno
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lembrança, flor a morrer...

no meu rosto hoje é inverno
é um barco na maré alta
que o vento leva raivoso
que inferno!
a saudade me faz falta.

era janeiro um choro desatado
mas logo na seara um girassol
por todos amado,
apesar de inverno mas dia de sol!

a vida é um rio solto
um mar revolto
uma abelha recolhendo o mel
um delírio que suga minha pele


por tudo isso a dor
que me aperta o peito
e sem jeito, os olhos me molha
o amor?! ah o amor!
esqueceu o rosto
já pouco o olha!

rosto de inverno que estremece
que é paisagem que ninguém quer
ver
a primavera já esquece
na memória perece!
lembrança é flor a morrer

chegou-lhe o tempo sem futuro
onde o sol não se pendura
grita-lhe o esquecimento duro
esquece, foi-se a formosura

já a manhã não surpreende
dói o olhar o espelho
é então que meu rosto entende
que não é só o espelho
que está velho.

natalia nuno
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quinta-feira, 21 de agosto de 2025

o verso...


escrevo este verso
faz de conta que não sou eu
há coisas que a gente não perdoa
e ele é filho,
- que não me reconheceu!

foi à vida
sem despedida,
vou aguentar quanto puder
vou deixá-lo carpir,
e quando tempo houver
talvez interrompa o poema
para o  verso vê-lo sorrir

ele é meu por direito
é a minha face no espelho
fala de saudade e nostalgia
e tal como eu está velho!

veste a minha pele 
como outros tantos
há os que são de mel,
e os outros de desencantos

são filhos na saudade parados
no silêncio, paridos sem poesia,
porém ansiosos que eu os liberte
um dia.
- como velhos achados!

natalia nuno
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terça-feira, 19 de agosto de 2025

poema dum dia adverso...


a minha poesia
tem dias
que me quer bem, 
me alenta, me acalenta
como nada, nem ninguém

noutros faz da vida barca
ao cais encostada
de remos parados e quilha
quebrada
ninguém mais a olha,
vem uma onda e a molha!
deixa-a de saudade encharcada

uma nuvem cinzenta
gaivotas devotas
a fazer de guarda,

às vezes aparenta
que vai de vento em pôpa
e ao chegar ao fim 
a morte não a poupa!
..................................

a poesia me quebranta
onde a dor mais me dói
me põe frente ao abismo
mas o poema é meu herói

continuo o jogo
do gato e do rato
estarei presente
até, ao último acto.

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inspiração sem nexo, há dias assim, 
percorre-se a noite esperando um
impulso dado, mas a poesia rege um mundo
de silêncios.



domingo, 17 de agosto de 2025

a utopia que me leva...




hoje deito o poema fora
quero a noite sem hora
não quero nada que me doa
serei ave que voa
quero-me viva
que nada me retenha

quero sentir-me activa
quero ser alma da saudade
e vida da alegria
ter a bondade que me adoce
o coração, e não atormente como hoje
a poesia

poema criado imperfeito
ora me despe, ora floresce
é jogo para a morte iludir
um ardil que sempre cresce
quando a noite está pra vir

poema serve para tudo ou
para nada
que de nada me serve
e nem me fala da saudade
como se atreve?

deito fora, sem idade nem data
olho-o com altivo desdém
não será memória pra ninguém

sonâmbulo não acordará
nem sabe quantos anos andará
foi poema com quem cruzei
que me fez promessas vãs
nasceu fora do meu regaço
atormentou minhas manhãs

na tentativa do meu abraço
como se me importasse o tema
se o poema,
- não me fala de saudade!

natalia nuno
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à procura de mim...



o sonho adormeceu
durou tão pouco
ficou remoto, não me aqueceu

meu tempo é limitado
hoje meu sorriso se fechou
fez-se silêncio
ficou o vento pendurado
nas janelas, debruço-me nelas
à procura de mim

a memória acena-me distâncias
quando chorava no berço 
minha avó por perto rezando o terço
lembro ainda a ladainha


sinto que sou uma andorinha
que emigrou para longe
nesta vida tão excessiva
cujo sopro descaminha

com que prazer o tempo
me esmaga!
apagando mais um pouco
a última miragem
fico à espera que o espelho traga
nem que seja uma pálida imagem

um dia perco o brio
que me resta,
e rompo a negação
não quero mais que meus olhos
molhados, 
vejam triste meu coração.

natalia nuno
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sábado, 16 de agosto de 2025

contudo pergunto, ama-se ou odeia-se?...



vem o sol e nos aquece
logo o frio nos arrefece

há quem diga que a vida
é para ser bem vivida

atenção não vá ao engano
pode vir-lhe daí algum dano

a noite antecede o dia
p'la manhã canta o galo
- com alegria!

ficam os sonhos na almofada
desperta a realidade
- daqui a nada!

o tempo, com que prazer nos esmaga
a infausta memória humilhada

mesa posta, pão na mesa
que amanhã não há certeza

a fome grassa por perto
vida sem jeito, sem amor é deserto

não há quem possa estancar
tenho até repulsa de lembrar

a terra verde adormecida
onde o veneno não se fez esperar

moeda falsa, maldição
falta de amor pelo próximo
ama-se ou odeia-se?
e a paz a cair ao chão!

o mundo em desgraça presente
cruxifica a vida de tanta gente

a paz distancia-se humilhada
é velha memória guardada


natalia nuno
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se eu pudesse esconjurar...



há um caminho entre a bruma
calem-se sirenes e alarmes
o pavor que incendeia
até não restar coisa alguma

e ninguém acode a ninguém
nem ousam o frente a frente
e o mundo já agoniza
e o que se tem?
guerra que o mundo não precisa
nem de alguém com soberbo desdém

ah, se eu pudesse esconjurar
o louco que abriu a ferida
mostrar lhe o meu desprezo
até ele agonizar?!

é tamanha minha aversão
que fico sem coração
se fosse jovem e forte
lutaria pela paz até à morte.

somente o silêncio
neste mundo esfarrapado
não se pode cair no engodo
de gente que se diz do nosso lado

a terra é sombra perdida
luz apagada, mais frio que inverno
cai em desgraça tanta vida
luz mortiça, um inferno!

natalia nuno
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