segunda-feira, 6 de julho de 2020

a infância feliz...



a infância feliz, se pudesse voltar e beber um pouco dessa doce eternidade, deixar verdejar o meu instinto de liberdade... ainda escuto a nossa alegria no subir e descer das árvores nessa infância harmoniosa...como entender agora a felicidade? como inventar sonhos?os dias apagam-se em si mesmos, nada se procura e pouco se espera, apenas o sonho insiste, éramos asas de vento num céu sem nuvens, meninos que traziam consigo o aroma da vida, unidos num nó que parecia inseparável, de risos repentinos e o coração cheio de lealdade...grato, foi envelhecer trazendo da infância saudade, de brincar livremente nesses dias lendários no meio da natureza com o aroma dos frutos e flores por perto, dos pássaros e trinados, das borboletas de mil cores e rostos tisnados pelo sol irradiando inocência...

natalia nuno
rosafogo
10/2003

inquietação...



sucedem-se as estações
morrem as tardes pelos dias fora
morrem minhas ilusões
afunda a vida e não melhora
como posso morrer  tanto de cansaço
venho de longe, esqueci o regresso
esqueci até teu íntimo abraço
cobre-se de pó o tempo que já esqueço
pergunto ao sol-pôr que deixa saudade
porque me arrefece o coração
e me deixa a sonhar em vão...

ando de lugar para lugar
não volto ao ponto de partida,
só o teu amor saberá onde encontrar
esta que de si anda perdida.
não sei o que fazer dos dias
aqueles que ainda longe ou muito perto
farão de mim fraca, ou forte,
lembraste quando me dizias
que comigo ficavas até à morte?
é agora outono, perde-se um pouco
mais de vida, ou será só inquietação?
ou tudo passará, até este momento louco
em que julgo ser o poema, perfeição.
nada é perfeito, tudo muda, tudo passa
menos o mar de amor
- que trago no coração.

natalia nuno

domingo, 5 de julho de 2020

pressentimento...



dói na memória com intensidade
ouvir o cansado ruído da lembrança
e a pressa da ameaça que se avizinha,
surgem nos olhos águas de saudade
treme o coração sem esperança
cresce o medo do que se adivinha.
na luz caída da tarde
o vôo perdido das folhas,
levando ao pensamento a verdade
da saudade, com que já me olhas.

no fogo secreto da noite
esquecíamos o tempo e a lentidão
amávamos-nos  sem fronteiras
e era alquimia percorrer teu corpo
com minha mão,
redimida no silêncio,
resgato do esquecimento
cada momento vivido
que a memória parece ter esquecido,
mas que ainda consigo alcançar
porque é grato recordar.

é no silêncio que se aprende a aceitar
o envelhecer
a perceber o tempo e o seu pulsar
a vida é este estar e não estar, é este temer
de não poder mais despertar
este é o pressentimento, o rumor das minhas
palavras, que não sei suster,
a dura angústia de cair no vazio
e aquele amor que nos uniu
seja um fio desatado, um sonho melancolicamente
esquecido,
no nosso sono apagado.

natalia nuno
rosafogo