quinta-feira, 9 de abril de 2015

sou ainda jovem...



sou ainda jovem
como jovem é a primavera
sou águia que espera
pelas ondas do vento
que me levam ao sonho
caindo lentamente no azul
desprendida do pensamento.
ave distante que desvanece
na linha do poente,
em mar transparente,
na quietude do entardecer
e nos sonhos se deixa perder.

e a vida como se nova fosse
bela e doce
toda ela felicidade,
como se nunca mais
pudesse ser
apenas saudade…

natalia nuno
fuseta 4/2015




quarta-feira, 8 de abril de 2015

almas penadas...



pequena prosa

falta apenas um passo para que o sol caia no mar, o céu está dum azul transparente, sem uma nuvem, apenas uma brisazinha a lembrar que ainda estamos em abril, nos montes as giestas estão em flor e a urze negra parecendo envernizada com florinhas brancas despontando, um ribeiro vai cantando, vem serpenteando por entre os freixos e medronheiros como se tivesse pressa de chegar a qualquer lugar ou viesse a fugir de qualquer coisa, mais ao longe um rebanho enfeitando a paisagem, as árvores agarram-se à terra com raízes fortes, ostentam galhos novos e folhas no seu verde esperança avisando que a primavera está por aí… também a passarada jorra a sua sinfonia,  e outra bicheza tal como as perdizes perdidas nos matagais procurando com ansiedade correr os campos ágeis e felizes, é hora de pensar na prole de procurar um esconderijo onde os pequeninos seres possam nascer sossegadamente sem perigos, as carriças fugidias assustam-se com pouca coisa e escondem-se no caniçal, nas silvas e tojos andam os insectos numa roda viva, alheios a todo o resto. O entardecer vai ficando cada vez mais escuro, já se ouvem os guizos das ovelhas que retornam ao curral, ouvem-se os sinos tocando às orações da noite, os carros de bois rangem estrada fora de volta à aldeia, e na encruzilhada ouvem-se passadas e vozes baixinhas, dizem ser almas perdidas, penadas, almas do outro mundo que vagueiam sem que se saiba porquê… a noite traz a sua magia e a quietude, assim como a certeza dos sonhos, e a esperança num mundo melhor...olho com lentidão o horizonte e ouço bater o coração e no assombro do momento tudo me parece realidade mas, é só a saudade.

natalia nuno
rosafogo

a linguagem da natureza...



pequena prosa

aqui na aldeia  a linguagem é a da natureza, o rumor dos pinheiros, os pássaros girando por entre as árvores num rodopio, acasalando, emitindo uma orquestra de sons, o sol é presença em cada flor em cada arbusto, enchendo o campo de tapetes verdes, liláses, amarelos, brancos e tons de chocolate, a água desperta em cada ribeira, cada regato, cantando a mesma melodia que aprendeu desde idades remotas, não há nuvens no céu, e o azul é igual ao manto de Nossa Senhora da Vitória... aos nossos olhos saltam borboletas de todas as cores, numa luta pela sobrevivência, abrindo suas asas de fogo sem descanso, fresca é a aragem do vento que desce da serra e se derrama nas folhas dos loureiros
que bordejam as margens do rio. Os trigais e as suas cabeleiras de fogo ondulam imponentes, tornando visíveis uma ou outra papoila vermelha, nas canas os sussurros da aragem invisível e o canto da calhandra ou da cotovia que por lá se abrigam, também o pintassilgo mostra a sua plumagem insinuando-se como o mais belo.
E até o destino em fuga, parece querer permanecer, vai rasgando devagar o arvoredo,  olhando as giestas amarelas, como se quisesse desertar da sua corrida e deixar-se anónimo na ternura do crepúsculo que já vai amadurecendo,trazendo o eco da noite à alma das coisas.
O sol já se afunda, mas amanhã estará de volta trazendo o orvalho pela madrugada, e quebrará de novo o silêncio dos pássaros... uma légua mais adiante a fruta medra a olhos vistos nos pomares e os meus olhos irrequietos olham o universo para se certificarem que não estão sonhando …